O Brasileiro tem toda a sorte do mundo de nascer em um país que "se ama", pelo menos de quatro em quatro anos, e pelo visto muitos estão interessados em sua história, sem contos e fábulas, a verdade acima de tudo. Mas será que este brasileiro quer a história sem cortes para nela se fundamentar e entender seu lugar no espaço e tempo, ou apenas uma maneira de humanizar os "heróis" da nação ao seu modo? igualar-se, entende? Muitos brasileiros são defensores de uma moral teocrática exemplar que acoberta seu caráter, e assim acreditam ser donos de uma razão moldada no período barroco. Acreditam em solidariedade, mas fecham a janela para a criança de rua, rezam para os desprivilegiados, mas passam correndo para não sentir o odor do mendigo na calçada da igreja. Me parece que procuram defeitos, e não qualidades, nas personagens que são referência, para justificar seus próprios erros, e assim deturpam a história, emergindo os erros, sufocando os acertos. Um exemplo vulgar: a biografia não autorizada de Roberto Carlos. Respeito os fãs deste músico, mas o que precisamos saber sobre ele é que foi muito importante em tempos de regime militar, como portador da voz da esperança para os que sofriam com os maltratos do governo. Ou simplesmente distraiu a massa com seu romantismo barato, e triunfou montado numa alienação de dar inveja à Britney Spears. Pois bem, um indivíduo escreve uma biografia no séxulo XXI que contém trechos muito íntimos da vida deste cidadão, e que o mesmo não queria que fossem divulgadas, então o livro se torna um "Best-Downloaded" na internet porque milhares de leitores querem saber o que o cantor faz quando não está na missa, ou quando não está galanteando uma mulher, ou mesmo quando não está indeciso entre camisas azuis e azuis. Faço-me valer da opinião de Voltaire à respeito da máxima de Cícero referente à história: "Que o historiador não ouse dizer uma mentira nem esconder uma verdade." É incontestável a primeira parte desse preceito. A segunda, é preciso examinar. Se uma verdade puder ser útil ao Estado, será condenável ocultá-la. Agora, suponhamos que escreveis a história de um príncipe que vos confiou um segredo: deveis revelá-lo? Deveis dizer à posteridade aquilo de que serieis culpado se o dissésseis até para um único homem? Deverá o dever do historiador vencer um dever maior? Mais ainda, suponhamos que fostes testemunha de uma fraqueza que não teve influência sobre os negócios públicos - deveis revelá-la? Neste caso a história seria uma sátira. Temos de admitir que a maioria dos escritores de anedotas é mais indiscreta do que útil. Que dizer então dos compiladores insolentes que, fazendo da maledicência mérito, imprimem e vendem escândalos como se estivessem vendendo peixe?
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Apresentaste a questão muy bien, meu velho, e concluíste melhor ainda:
´´Temos de admitir que a maioria dos escritores de anedotas é mais indiscreta do que útil. Que dizer então dos compiladores insolentes que, fazendo da maledicência mérito, imprimem e vendem escândalos como se estivessem vendendo peixe?´´
Parece mesmo ser uma característica específica dos nossos tempos essa glamourização da vida privada, que acaba encobrindo o mérito real da obra ou do legado dos personagens que vão obtendo destaque...ídolos de barro, finalmente falhos, finalmente humanos...